O uso obrigatório de plataformas digitais nas escolas da rede estadual de ensino tem gerado sobrecarga e revolta nos professores que dizem que a imposição traz menos qualidade no trabalho e desrespeita o planejamento das aulas. Já a Secretaria de Educação do Paraná (SEED – PR) defende o uso como e à docência.
Atualmente, são mais de 20 plataformas e aplicativos, sendo que pelo menos sete têm uso imposto pela SEED. O uso das ferramentas, segundo professores e especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato Paraná, desrespeita a autonomia pedagógica, limita o ensino e acaba por atrapalhar o planejamento das aulas que muitas vezes nada tem a ver com o que está inserido nas plataformas organizadas sem a participação das equipes pedagógicas das escolas.
Não há retorno para a aprendizagem
“Do dia para noite, plataformas foram implantadas e dados começaram a ser cobrados. As escolas precisam cumprir metas, painéis são instalados para dizer quais escolas estão devendo ou não. Quando estão no vermelho, professores são chamados para justificar porque a plataforma teve poucos os, desconsiderando o ritmo e planejamento de cada um. Ainda tem problemas, que na hora, muitas vezes, não conseguimos o, devido a um cronograma que se estabeleceu para que cada um e”, diz um professor de Inglês, que trabalha com turmas do sexto ao terceiro ano do ensino médio e não quis ser identificado.
Ele diz ainda que há pouco retorno dessas plataformas sobre a aprendizagem propriamente dita. “Nós, professores, amos à tarefa de tutores, de cumprir conteúdos impostos para alunos fazerem testes três vezes ao dia e não há retorno para os alunos se houve ou não aprendizagem”, avalia.
Recentemente, um grupo de professores e estudantes da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Paraná (UFPR) analisou as plataformas e considerou que a avaliação da aprendizagem é superficial. “Os ‘exercícios’ são corrigidos automaticamente pela plataforma. Isso significa que são de múltipla escolha, do tipo certo ou errado, verdadeiro ou falso: ‘Vovô viu a uva. O que vovô viu">
Uma professora de Lingua Portuguesa para alunos do Ensino Médio diz que o problema não são as plataformas e sim o uso obrigatório. “A questão da obrigatoriedade é o que complica um pouco, porque nós temos metas a cumprir e nem sempre essas metas são alcançadas, pois vários fatores são envolvidos nisso. Tem a questão de os alunos não terem o à internet nas suas casas, e às vezes na escola, ter muita, muita confusão. Concorrência, vamos dizer assim, para o uso dos computadores, a internet às vezes ter instabilidade da internet, enfim, são vários fatores que nos deixam aí infelizmente de mãos atadas, sem ter muito o que fazer,” diz.
Outra professora (que não quis ser identificada) também critica o uso das plataformas. “Diferente do que diz o Secretário de Educação, que não queremos modernidade e o uso das tecnologias, queremos, sim, desde que interagindo com o nosso planejamento, aos interesses do aluno, que é o que diz a Pedagogia”, pontua.
Para a pesquisadora de Tecnologias da Educação e professora da UFPR, Gláucia da Silva Brito, o uso das tecnologias só funciona se aliado ao que está acontecendo em sala de aula. “É preciso respeitar algumas condições prévias para o uso das plataformas educacionais para que, de fato, contribua para a qualidade do processo ensino aprendizagem, como a consulta aos professores sobre seus planejamentos, sobre o que precisam como e às aulas, que os professores recebam formação continuada efetiva para o uso da plataforma podendo entendê-la pedagogicamente e inseri-la nos seus planejamentos”, analisa.
Desrespeito à autonomia pedagógica
Neste ano, em agosto, professores liderados pela APP-Sindicato chegaram a fazer um dia de protesto e ficaram sem usar as plataformas. O sindicato tem se posicionado contrário à imposição do uso das plataformas.
Em nota, a APP disse que a raiz do problema está na imposição destas ferramentas que tomaram a centralidade do processo de ensino e aprendizagem, relegando professores ao papel de meros técnicos operadores de máquinas.
“A obrigatoriedade, atrelada à cobrança por metas, solapa a autonomia pedagógica e transforma a escola em uma fábrica de números e índices para o governo. O foco, portanto, não está na aprendizagem, questionada por estudos internacionais e pelos próprios docentes da rede, nem no apoio à rotina escolar, está no controle do trabalho pedagógico, na padronização de conteúdos e na manutenção do estado no topo do Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica] a qualquer custo. São atores privados que decidem quais plataformas serão usadas, o que vai ser ensinado e como vai ser ensinado”, critica a nota.
Uma pesquisa realizada pela APP-Sindicato entrevistando cerca de 300 professores atestou que, para mais de 80%, as plataformas não melhoram o aprendizado e a imposição tem gerado adoecimento entre os docentes.
A APP trabalha para abrir diálogo com a Secretaria da Educação sobre o tema e propor o estabelecimento de uma política que priorize a interação humana e a autonomia, regulamentando o tempo de estudo e trabalho diante das telas e a oferta de plataformas públicas.
O que diz a Secretaria de Educação
Em nota a SEED disse que “o emprego de recursos tecnológicos serve como metodologia de apoio à aprendizagem, consoante relatório expedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), acerca do emprego de ferramentas digitais como e ao processo educacional. Destaque-se que a adoção de recursos tecnológicos de aprendizado resultou em significativa contribuição com o aumento dos níveis do desempenho acadêmico dos estudantes da rede estadual de ensino. Há que mencionar também o aumento da pontuação do Paraná no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do Estado, que no último levantamento foi de 4,6, colocando o Estado no primeiro lugar nacional pela avaliação.”