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Fuga de lideranças bolsonaristas revela medo de prisão, mas extrema direita segue influente, avaliam especialistas

Professores veem avanço institucional contra golpistas, mas destacam continuidade da extrema direita

As recentes movimentações de figuras da extrema direita brasileira, como a deputada Carla Zambelli (PL-SP), o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o blogueiro Allan dos Santos, que deixaram o país ou vivem no exterior em meio a investigações e ordens de prisão, foram analisadas pelos professores Cláudio Couto e Valério Arcary no podcast Três por Quatro, do Brasil de Fato. Para eles, os episódios revelam um recuo jurídico, mas não significam o fim da influência política desse campo.

“Se der bobeira, vai para a cadeia”, resume o cientista político Cláudio Couto. Para ele, trata-se da atuação de um “grupo criminoso” que “atenta contra a democracia, desrespeita o Estado de Direito” e agora tenta se proteger. “É por isso que temos essa debandada de lideranças da extrema direita, que vão pra lugares longínquos onde acreditam, ou até de fato, talvez, consigam ficar longe das garras da justiça.”

Esses destinos, como Estados Unidos, Itália e Hungria – caso do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) –, países com governos ou lideranças alinhadas à extrema direita global, refletem, segundo Couto, uma tentativa de autoproteção. Mas ele acredita que a estratégia “tem um quê de mambembe”, ressaltando que, apesar da fragilidade aparente, essas redes contam com articulações internacionais.

O caso de Carla Zambelli, que alegou ter cidadania europeia e estaria cogitando abrigo na Itália, foi analisado com ceticismo. “Ela ainda se encontra numa situação de razoável vulnerabilidade”, diz Couto. Ele explica que a legislação italiana permite extradição mesmo de cidadãos com dupla nacionalidade, se seus vínculos forem mais fortes com outro país, o que se aplicaria à deputada.

O historiador Valério Arcary considera que figuras como Zambelli são periféricas, e prevê consequências para as suas ações. “Zambelli é um míssil sem direção. Não faz parte do núcleo dirigente nem do bolsonarismo, nem da extrema direita. É uma aventureira. […] Será uma questão de tempo até que vá para a prisão.”

Couto critica a lentidão de instituições como a Procuradoria-Geral da República (PGR), que permitiram, por exemplo, a saída de Zambelli do Brasil. “Alguns dos atores que movimentam esses instrumentos de controle e de defesa da democracia comeram mosca”, analisa, destacando também a omissão do Congresso diante da proposta de anistiar os envolvidos no 8 de janeiro de 2023.

Mas o cientista político reforça que, apesar das falhas, o sistema de Justiça brasileiro vem reagindo. “Todos estão sendo julgados no Supremo”, aponta. Para ele, o que está em jogo é a solidez das instituições democráticas brasileiras diante da ofensiva autoritária.

O bolsonarismo ainda vive

Apesar da saída de investigados do país e de condenações no Supremo Tribunal Federal (STF), o historiador Valério Arcary vê o momento como paradoxal. “Do ponto de vista jurídico-político, a extrema direita está na defensiva e o mais provável é que o núcleo central da conspiração golpista venha a ser condenado e, eventualmente, preso, pelo menos por algum tempo. Mas, do ponto de vista da relação social e política de forças, a extrema direita tem um peso gigantesco dentro do Congresso Nacional.”

Para ele, o bolsonarismo ainda mantém articulação e peso político. “A extrema direita impõe um ‘cala boca’ às pré-candidaturas da direita que querem substituir Bolsonaro. A palavra de Bolsonaro ainda conta muito neste país”, diz.

O historiador vê o campo bolsonarista se reorganizando com foco nas eleições de 2026. “A estratégia está clara: independentemente do julgamento no Supremo, Jair Bolsonaro vai ser pré-candidato até agosto de 2026. E a direita tradicional negocia um plano B, como [o governador de São Paulo] Tarcísio de Freitas (Republicanos), desde que haja garantia de indulto ao clã Bolsonaro.”

Arcary lembra que “nunca tivemos uma situação mundial tão ruim desde os anos 1930. Estamos diante de lideranças neofascistas que seguem em luta aberta pelo poder. É uma corrente de combate, que continua crescendo.” Ele avalia que há espaço para a esquerda crescer, desde que consiga explorar a divisão entre direita e extrema direita. “Mas isso depende de inverter a conjuntura, porque hoje estamos na defensiva.”

O videocast Três Por Quatro vai ao ar toda quinta-feira, às 11h ao vivo no YouTube e nas principais plataformas de podcasts, como o Spotify.

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